Introduzida em 1949, visava os detentores de licença de transmissão exigindo-lhes que “apresentassem assuntos controversos de interesse público e que o fizessem de forma honesta, equitativa e equilibrada”.
Por outras palavras, na cobertura de assuntos que na sociedade não encontrassem consenso, os dois lados da questão deveriam ser cobertos, de modo que o público pudesse decidir por si mesmo qual dos argumentos o convencia mais.
Durante muito tempo, esta doutrina foi vista como prejudicial aos setores mais conservadores da sociedade americana. Por volta dos anos 80, vendo oportunidades para distorção da norma, vozes ultraconservadoras como Pat Buchanan começaram a apoiar a doutrina.
Hoje, é possível encontrar artigos de think tanks conservadores, como a Heritage Foundation ou o Cato Institute, a celebrar a abolição da doutrina de justiça.
Aquando da abolição da doutrina de justiça, foi citado como motivo o receio de que as três principais estações televisivas - a NBC, ABC e CBS - monopolizassem os seus espaços de modo a “indevidamente influenciar a agenda pública”. Algo que a própria doutrina de justiça impedia.
Este passo é visto como um dos pontos de acelaração da polarização da sociedade americana, tendo tido como consequência imediata o aparecimento da talk radio conservadora e numa fase mais tardia a talk radio liberal/progressista. Ambientes propensos à criação de bolhas de informação que isolam os seus ouvintes de pontos de vista opostos, criam desconfiança relativamente ao outro, e têm como tendência a propagação de informação falsa, muitas vezes sob a forma de teorias de conspiração.
A informação e o debate foram substituídos pela indoutrinação e o maniqueísmo, com os dois lados a verem-se um ao outro, não como grupos com visões políticas e sociais diferentes, mas sim como inimigos um do outro e, em última análise, da nação.
Os exemplos mais óbvios deste fenómeno são figuras como Rush Limbaugh, Bill O'Reilly, Tucker Carlson, Jimmy Dore ou Kim Iversen.
Este problema não fica pelo outro lado do Atlântico e esta decisão da administração Reagan teve consequências globais, particularmente sentidas também na Europa.
Se nos Estados Unidos é fácil identificar que o móbil da FOX News ou da MSNBC não é o de informar, mas sim de munir ideologicamente o seu público; em Portugal, vemos já exemplos de publicações principalmente noticiosas munidas de uma agenda política específica, como o Observador, que inclusivamente já tem estação de rádio. No Reino Unido, temos a Sky News, pertencente ao grupo do mogul da média Rupert Murdoch que também é dono da FOX News.
É difícil dizer se a doutrina da justiça teria resistido ao aparecimento da internet e em particular de redes sociais como o Facebook ou o Twitter, tal como é difícil garantir que não teria sido distorcida para efeitos nefastos, mas podemos dizer com segurança que se hoje os nossos fóruns têm o nível de toxicidade que têm, muito disso devemos à revogação da doutrina de justiça, do outro lado do Atlântico.
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