O leitor há de perguntar: Mas porquê? Não é absolutamente lastimável que apenas 0,7% dos alunos saibam identificar a península onde o seu próprio país se localiza? E a minha resposta é que sim, de facto, é. E adiciono: não é só isso que é lastimável.
É também lastimável o modelo altamente centralizado de alocação de docentes que, enquanto lhes providencia condições remuneratórias de fazer o país corar de vergonha, lhes oferece pouca ou nenhuma estabilidade no que diz respeito ao local onde lecionam. Um professor do Porto pode neste ano letivo lecionar, por exemplo, na Escola António Sérgio em Gaia, e no próximo não ter colocação ou se quiser evitar esse desfecho a todo o custo sujeitar-se a ser colocado, por exemplo, numa escola em Faro ou até nas ilhas.
Quando era mais jovem, considerei seguir pela carreira de professor, mas, ainda adolescente, rapidamente desisti da ideia. Já me era óbvio que era uma carreira que não recompensava os esforços destes profissionais e que lhes pedia enormes sacrifícios.
Outro fator que contribui para estes lastimáveis resultados (cito a geografia, mas o quadro não está bonito noutras disciplinas) será, à falta de opinião mais bem informada, a cultura de facilitismo que aparenta ter-se instalado na nossa educação.
Se antes, um aluno poderia ser retido se se considerasse que não havia demonstrado adquirir as competências necessárias para avançar para o ano seguinte, hoje isso dificilmente acontece (embora seja, em teoria possível, a retenção é vista como algo com caráter excecional que deve ser reservado para os fins de ciclos). Ou seja, temos alunos a chegar ao 5º ou ao 9º ano que nunca enfrentaram o mais pequeno grau de exigência e em 2019 tínhamos 24,5% dos alunos a chumbar no 12º ano.
E talvez por isso se dê este choque. Em criança eu tinha gosto por geografia, mas reconheço que era a exceção. As outras crianças estavam mais interessadas noutras coisas, o que é natural da infância. Se não lhes for exigido atenção às disciplinas por força de uma potencial avaliação negativa dar numa retenção, as crianças não terão incentivo para investir tempo e atenção nestas matérias.
Um fator que se mantém desde o tempo em que eu frequentava o 5º ano até hoje é a dificuldade dos alunos na disciplina de matemática.
Ora, como poderá Portugal competir no futuro se deixa todos estes problemas por resolver? Se nós como sociedade não soubermos identificar a importância de uma educação de qualidade para o desenvolvimento das capacidades das crianças e dos adolescentes que darão forma ao nosso futuro como nação?
Dir-me-ão que existem outros fatores e que a pandemia de COVID-19 prejudicou as aprendizagens dos alunos de forma pronunciada. E certamente que isso é verdade e os próprios dados reportados no artigo do PÙBLICO revelam esse impacto. As aprendizagens parecem estar a correr melhor para os alunos que começaram o seu trajeto após o pior da pandemia ter passado.
O problema é que toda essa boa vontade desaparece quando me lembro das múltiplas vezes que o governo afirmou que estava a efetuar a recuperação dessas aprendizagens com sucesso. Este sim, digno de aspas.
Urge repensar o nosso modelo de educação em todos os seus aspetos. Desde o currículo até ao modelo de avaliação dos alunos. É de considerar que as provas de aferição passem a ter peso na avaliação dos alunos. É de considerar voltar a instituir a retenção dos alunos antes de chegarem ao 9º ano.
Urge também repensar a forma como as escolas se organizam. Fará sentido este modelo altamente centralizado que deixa professores com deslocações absurdamente longas e turmas sem professores?
E urge repensar a remuneração dos professores que, ao longo das décadas, têm feito muito com pouco.
Só com um currículo mais completo com ênfase na exigência e na excelência, com carreiras mais estáveis e atrativas, e uma autonomia aumentada das escolas para resolverem os seus problemas poderemos sair destes "sucessos" para sucessos dignos desse nome.
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