Há uns dias, aquando do anúncio de Alexandra Leitão como candidata do PS à Câmara de Lisboa, Carlos Moedas usou o termo radical para descrever a sua principal concorrente ao posto que atualmente ocupa. Tudo isto sem nunca explicitar o porquê do radicalismo de Alexandra Leitão.
Alexandra Leitão é radical porque o moderado Carlos Moedas
assim o ditou. Basicamente resume-se a isto e quem disser contrário deverá
também ser radical.
A líder parlamentar do partido que negociou com o
super-moderado governo da AD para a viabilização do orçamento de estado para
este ano é uma radical sem que qualquer razão para esse “facto” tenha sido
aventada.
Mas engane-se quem pense que este exagero no adjetivo
radical é caso isolado. É que radicais não faltam. Vejamos...
Pedro Nuno Santos, quando disse que não aprovaria um
orçamento que fosse fiscalmente irresponsável era radical, deixou de o ser
quando viabilizou o orçamento, mas há de voltar a sê-lo quando der jeito ao
PSD.
Rui Tavares é um radical porque o seu partido acredita que
se deve estudar o Rendimento Básico Incondicional – ênfase na palavra estudar.
Que dirão se algum dia chegarmos à implementação?
Mariana Mortágua é uma radical por denunciar a forma como a
ortodoxia financeira europeia prejudica o nosso país, por querer reposições de
carreiras na integridade e por acreditar que se deve lutar por uma vida boa.
Durante as europeias, Catarina Martins e Francisco Paupério
com certeza terão sido radicais por alertarem para a crise climática e
denunciarem a desumanidade do Pacto Europeu para as Migrações.
Ainda que a direita democrática faça um esforço para
singularizar o Chega como radical (pelo menos isso), a mesma direita não aponta
para Cotrim de Figueiredo ou Rui Rocha e diz “radical” quando nos programas
destes constava uma taxa única de IRS de 15% - uma medida absolutamente injusta
e incomportável que teria como efeitos o deteriorar das contas públicas e o
agravar das assimetrias sociais e de classe.
É quase como se o ponto aqui não fosse o de denunciar o
radicalismo, mas sim determinar a partir da posição dominante de figuras de
direita no espaço mediático o que ser moderado é. E só por acaso, ser moderado
é concordar com o PSD e o CDS (AD) e ser radical é, geralmente, estar à sua
esquerda.
Em alguns casos o esquerdismo… perdão, o radicalismo pode
ser tal que meramente caracterizar como radical não serve. Nestes casos tem que
se usar o termo “extrema-esquerda” e usar de todos os dispositivos retóricos
para equiparar o transgressor à extrema-direita.
Este último ano tem sido pródigo em “moderação” e
“radicalismo”. Não tem sido é pródigo em consistência e na denúncia do que é
verdadeiramente radical: coisas como a fusão entre a imigração e a perceção
(repito, perceção) de insegurança a arrepio de todos os dados estatísticos, o
degradar do SNS e da educação pública com vista a pôr mais e mais nas mãos dos
privados, ou a ideia avançada pelo moderadíssimo Gouveia e Melo de que os
apoios sociais são menos importantes do que a despesa em defesa. Nada disso é radical.
Mas ousar ter propostas para melhorar a vida das pessoas,
isso sim é radicalismo e populismo do pior.
E o pior é que, fazendo jus à máxima do propagandista nazi
Goebbels de que uma mentira repetida mil vezes se torna verdade, e numa
demonstração da veracidade da tese da hegemonia cultural de Gramsci, o
eleitorado, fazendo fé às sondagens, parece estar de acordo.
Porque estamos nós preocupados com o rótulo de radicais
quando façamos o que fizermos, independentemente dos estudos que fizermos, das
contas que apresentarmos e do bem que pretendermos fazer, esse rótulo ser-nos-á
sempre aplicado? Façamos como Bernie Sanders e aceitemo-lo porque este é um
tempo de rotura.
Precisamos de rotura de uma cultura do capital para o
capital.
Precisamos de recentrar a política nas pessoas.
Precisamos de recuperar o rasgo de sonhar um mundo melhor.
Com os pés no chão, mas com o olhar no horizonte. Porque o nosso “radicalismo”
é viável e, mais do que nunca, necessário.
Sejamos, portanto, radicais com toda a força e convicção
porque doutra forma a democracia não se salvará.
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