O período da "Resistência" que se seguiu à primeira vitória de Donald Trump em 2016 foi, por vezes, constrangedor e, na maior parte do tempo, mais focado na imagem do que em política substancial. E, no entanto, dou por mim a sentir falta desses tempos. Por todos os erros que os Democratas cometeram, ao menos podia-se dar-lhes um "20" pelo esforço, mesmo que mal direcionado.
No final de contas, culpar os russos, Jill Stein e um
pagamento secreto à atriz de filmes para adultos Stormy Daniels pela vitória de
Trump revelou-se inútil e desviou o foco dos verdadeiros problemas dos
Democratas.
A adesão ao pensamento neoliberal, o abandono da classe
média e a ênfase excessiva na política identitária levaram-nos a um nível de
absurdo que a maioria dos países progressistas da Europa nem sequer imaginaria.
Por não terem aprendido as lições de 2016 e continuarem a
ignorar as de 2024, a oposição Democrata a Trump tem sido completamente
ineficaz (para dizer o mínimo). A sensação entre aqueles que discordam da
agenda de Trump é que os Democratas
nem sequer estão a tentar. Estão num estado de estagnação.
A eleição para a presidência do DNC foi um exemplo disto.
Quanto se falou sobre reindustrialização ou requalificação profissional? Quanto
se falou sobre inflação?
O DNC preferiu fazer uma declaração sobre estarem em
"terras roubadas" em vez de abordar a principal preocupação do povo
americano: a economia.
Perante uma
política de tarifas anunciada que alguns especialistas alertam ter todo o
potencial para aumentar
os preços para os consumidores americanos, os Democratas disseram muito
pouco sobre isso. Muito menos ofereceram uma alternativa.
Os Democratas recusam-se a reconhecer o papel que a sua
falta de uma mensagem económica viável – uma que seja simultaneamente correta,
facilmente compreensível e que esteja no centro da sua agenda política –
desempenhou na incapacidade de mobilizar a sua base ou conquistar
independentes. E, no entanto, este facto está diante dos seus olhos.
Em termos de aparência, o Partido Republicano conseguiu
posicionar-se como o partido
dos trabalhadores. Apesar das suas políticas que favorecem a elite
financeira e a sua postura anti-sindicatos, os Republicanos conseguiram criar a
perceção de que são eles quem defende os trabalhadores. Como o fizeram?
Apresentando o seu caso com confiança.
O Partido Democrata, por outro lado, tornou-se efetivamente
o partido
das elites. Escolheram a companhia de celebridades e bilionários na
campanha eleitoral em vez de sindicalistas e figuras progressistas como Bernie
Sanders ou Elizabeth Warren.
Como escrevi noutro texto, não fizeram a sua
argumentação em bases económicas, pelo que qualquer proposta favorável aos
trabalhadores presente na campanha Harris/Waltz foi tratada como nota de
rodapé, em vez de ser central à razão pela qual deveriam ser eleitos.
Os Democratas apostaram que Roe v. Wade e a democracia
seriam argumentos suficientes para vencer Trump. Certamente, em abstrato, esses
dois temas são importantes e são razão mais do que suficiente para votar nos
Democratas. No entanto, é preciso falar dos problemas económicos daqueles que
foram abandonados pela globalização e pela transição para uma economia cada vez
mais digital e automatizada.
Se os Democratas quiserem mudar o seu rumo, precisam de
desenvolver uma visão económica clara e ousada que aborde diretamente as
preocupações da classe trabalhadora. Isso inclui mais proteções laborais, uma
política industrial concreta e uma posição sobre comércio e automação que
tranquilize aqueles que ficaram para trás nas transformações económicas.
Por mais importante e indispensável que seja a defesa das
liberdades civis e dos direitos das minorias, nada disso servirá de muito aos
Democratas se não apresentarem uma agenda política forte que inclua, além
disso, uma agenda económica ousada, focada em resolver os problemas económicos
que levaram grande parte do eleitorado a votar em Donald Trump, num terceiro
partido ou simplesmente a não comparecer às urnas em 2024.
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